Inclusão Social

Este Blog prove um espaço de informações, pesquisa e interação com pesquisadores, profissionais, estudantes, familiares e portadores de deficiência que tenham interesse nos assuntos referentes à Nova Era da Inclusão Social.

Saturday, November 25, 2006

PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO V

CONCEPÇÕES MÉDICAS E EDUCACIONAIS SOBRE A CEGUEIRA

(Trecho extraído do livro “Compreendendo o cego” uma visão psicanalítica da cegueira por meio de desenhos-estórias, de Maria Lúcia T.M. Amiralian, São Paulo, Casa do Psicólogo, 1997, p. 21 a 33.

A característica específica da cegueira é a qualidade de apreensão do mundo externo.
O conceito médico de cegueira é a medida da capacidade visual das pessoas portadoras de deficiências no órgão da visão. A medida utilizada para a determinação da cegueira é a acuidade visual, definida por Rocha e Ribeiro-Gonçalves 1987 “como o grau de aptidão do olho para discriminar os detalhes espaciais”.
Um conceito aceito há muito tempo (Lowenfeld, 1950), e aprovado pela OMS em 1972, diz que cegos são aqueles que apresentam acuidade visual de 0 a 20/200 (enxergam a 20 pés de distância aquilo que o sujeito de visão normal enxerga a 200 pés), no melhor olho, após correção máxima, ou que tenham um ângulo visual restrito a 20º de amplitude.
São considerados indivíduos com visão residual aqueles que apresentam acuidade visual de 20/200 pés a 20/70 pés no melhor olho, após correção máxima.
Após a década de 70, passaram a ser considerados cegos aqueles para quem o tato, o olfato e a cinestesia são os sentidos primordiais na apreensão do mundo externo. E sujeitos com visão residual, aqueles que, embora prejudicados na visão, a utilizam satisfatoriamente em seu processo de aprendizagem.
Observa-se aqui uma mudança: antes, o braile era indicado aos sujeitos diagnosticados clinicamente como cegos; agora, são considerados cegos aqueles que necessitam do método braile para a aprendizagem da leitura e escrita. Pode-se considerar neste movimento uma leve tendência à mudança na percepção dos sujeitos cegos. Até esse momento, eram cegos aqueles que os médicos assim o considerassem. Depois, passaram a ser denominadas cegas aqueles pessoas que, pelo seu próprio comportamento visual, indicavam a ausência de uma percepção eficaz.
Como para os educadores a preocupação com a cegueira centra-se nas condições necessárias e apropriadas ao desenvolvimento e à aprendizagem satisfatórios, um outro fator mostra-se de grande importância: a época da incidência da cegueira. Sem dúvida, o sujeito que nasce cego, que estrutura o seu ego e organiza toda a sua estrutura cognitiva a partir da audição, do tato, da cinestesia, do olfato e da gustação, difere daquele que perde a visão após seu desenvolvimento já ter ocorrido.
Do ponto de vista educacional há, portanto, necessidade da consideração de dois grupos distintos: os cegos congênitos e os possuidores de cegueira adquirida.
Estudos indicam que o sujeito que perde sua visão antes dos 5 anos não retém qualquer imagem visual, enquanto aqueles que a perdem posteriormente podem reter uma estrutura de referência visual útil, que os torna capazes de visualização.
Em função destes estudos, estabeleceu-se a idade de 5 ano como parâmetro para se considerar a cegueira congênita ou adquirida, para fins educacionais.
Cremos que a criança que nasce cega difere daquela que perde sua visão aos 4, ou mesmo aos 2 anos de idade, pois, mesmo que estas crianças não possam utilizar-se da memória visual, todas as suas relações objetais ocorrem por meio da visão, e principalmente o vínculo mãe-bebê se dá em outras bases.

O QUE SIGNIFICA A PERDA DA VISÃO?

(Trecho extraído do Caderno da TV Escola – MEC, deficiência visual, nº 1/2000), p. 8 e 9.

Para quem enxerga, é impossível imaginar a vida sem qualquer forma visual ou sem cor, porque as imagens e as cores fazem parte de nosso pensamento. Não basta fechar e tentar reproduzir o comportamento de um cego pois, tendo memória visual, a pessoa tem consciência do que não está vendo.
As causas mais freqüentes da cegueira e visão subnormal são:
- Retinopatia da prematuridade causada pela imaturidade da retina, em decorrência de parto prematuro ou de excesso de osigênio na incubadora.
- Catarata congênita em conseqüência de rubéola ou de outras infecções na gestação.
- Glaucoma congênito que pode ser hereditário ou causado por infecções.
- Atrofia óptica.
- Degenerações retinianas e alterações visuais corticais.
- A cegueira e a visão subnormal podem também resultar de doenças como
diabetes, deslocamento de retina ou traumatismos oculares.


ALGUMAS DIRETRIZES PARA A INTERVENÇÃO EDUCACIONAL JUNTO À
PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA VISUAL.

(Trecho extraído do livro “Deficiências alternativas de integração. Elisabeth Becker ...[et al.]. São Paulo: Casa do Psicólogo, 1997), p. 73 a 90.

São delineados a seguir os pontos que demandam atenção e guiam o enfoque de intervenção educacional:
1. Na comunicação, em nossa cultura, há predominância do visual e do verbal. Se o educador não estiver atento a isso, fará uso de conhecimentos não acessíveis ao deficiente visual, fazendo com que ele desenvolva uma linguagem e uma aprendizagem conduzidas pelo visual.
2. Para que o deficiente visual organize o mundo ao seu redor, é necessário que use o mais possível todas as suas possibilidades (táteis, térmicas, olfativas, auditivas, cinestésicas), e fale sobre sua experiência perceptiva.
3. A maneira de o deficiente visual relacionar-se com a sua professora é importante para que utilize e amplie suas possibilidades. A atitude da professora pode ser a de tutelar ou proteger (solicitude protetora), dando-lhe informações diretivas sobre o que fazer, impedindo-o de explorar/conhecer e conhecer-se, ou, ao contrário, a de estar junto a ele (solicitude emancipatória), contribuindo para que a pessoa deficiente visual encontre seus próprios meios de agir.

SINTETIZANDO CONDIÇÕES PARA A EDUCAÇÃO DO DEFICIENTE VISUAL

a)O educador é fruto do que aprende:
É importante para o educador que trabalha com o deficiente visual:
· Ter confiança na sua experiência e conhecimento (como ser humano e profissional) e perceber a similitude entre as crianças portadoras de deficiência visual e as crianças normais;
· Estabelecer níveis realísticos de expectativas para a criança, quer na escola, quer no lar (tanto no que se refere às aquisições de conhecimentos e habilidades, quanto à disciplina e conduta). A criança responde bem quando sabe o que é esperado dela e quando o esperado está de acordo com suas habilidades.

b)O educador pode ser criativo, buscando outros caminhos perceptuais:
Se o portador de deficiência visual dispõe de visão residual, deverá ser estimulado a fazer uso dela, o que enriquecerá seu conhecimento proveniente dos outros sentidos.
A possibilidade de conversar com alguém sobre o que está percebendo, explorando e fazendo propicia à criança:
· O desenvolvimento de sua capacidade de expressar e comunicar o que percebe, sabe e sente;
· Ampliação de sua linguagem (tanto no que diz respeito a seu vocabulário, como no que se refere à correção de sua expressão verbal);
· Assegurar conteúdo concreto para a representação mental correspondente à palavra utilizada (ela falará do que tem contato em vez de utilizar palavras sem significado para ela).
A intervenção educacional junto à criança cega, tanto como à vidente, estará voltada para a Educação integral da criança, porém deverá assegurar-se, como ponto de atenção, o propiciar condições para que a criança deficiente visual:
1. desenvolva conhecimento corporal e espacial tão seguro quanto possível, para que ela tenha uma atitude correta dos movimentos naturais e se mantenha tão ativa quanto for possível;
2. desenvolva representação tão completa quanto possível das coisas, através de exploração sensorial, suscitando seu interesse pela ação e para a ação.

RELAÇÃO EDUCADOR X CRIANÇA – O AUTOCONCEITO:

O autoconceito é o conceito que cada indivíduo tem de si, que se forma no convívio com outras pessoas. Resulta de um conjunto de inferências que uma pessoa faz sobre si baseado em sua experiência, num composto de suas próprias percepções e das descrições de outros.
O autoconceito se forma e desenvolve na relação da criança com o educador (pais e professores), e na interação com o que a cerca. Os seguintes fatores constituem referência para definição do autoconceito:
a) a forma de os educadores se relacionarem com as crianças, que serve como referencial para ela se valorizar ou não;
b) os valores e aspirações, que influenciam seu sentimento de competência e adequação;
c) o grau de equilíbrio entre sucessos e fracassos;
d) a capacidade de controlar os julgamentos de desvalorização sobre ela expressos pelos outros:
- alguns rejeitam essa ameaça a seu autoconceito positivo;
- outros são sensíveis à avaliação negativa e a incorporam.

Conforme afirma Jones (1963), situações específicas contribuem para a formação do autoconceito da criança portadora de deficiência visual. Os itens a seguir ilustram isso.
A criança deficiente visual precisa:
- de contato e estimulação, através de seus sentidos remanescentes, para não ter o sentimento de isolamento;
- que as expectativas dos pais em relação a ela considerem suas possibilidades e limites impostos pela deficiência. em vez de tomarem como referência padrões de desenvolvimento da criança vidente;
- do estabelecimento e esclarecimentos sobre padrões apropriados de performance que a motivem a ajustar-se a suas possibilidades e seus limites;
- que os educadores tenham reação emocional de aceitação à deficiência visual e aos limites impostos por ela, atribuindo à criança responsabilidades, de acordo com sua idade e desenvolvimento;
- de contatos com pessoas e objetos, por meio dos sentidos de que dispõem, em substituição aos que não pode ter pela ausência ou restrição visual;
- de oportunidades para experienciar e falar de suas descobertas sobre a permanência de pessoas e objetos que se constroem através dos seus sentidos remanescentes.

SUGESTÕES DE RECURSOS DE ACESSO AO CURRÍCULO PARA ALUNOS COM NECESSIDADES ESPECIAIS, SEGUNDO NECESSIDADES ESPECÍFICAS

(Trecho extraído dos PCNs (Parâmetros Curriculares Nacionais) – adaptações curriculares – estratégias para a educação de alunos com necessidades educacionais especiais, p. 45 e 46):
· materiais desportivos adaptados: bola de guizo e outros);
· sistema alternativo de comunicação adaptados às possibilidades do aluno: sistema braille, tipos escritos ampliados;
· textos escritos com outros elementos (ilustrações táteis) para melhorar a compreensão;
· posicionamento do aluno na sala de aula de modo que favoreça sua possibilidade de ouvir o professor;
· deslocamento do aluno na sala de aula para obter materiais ou informações, facilitado pela disposição do mobiliário;
· explicações verbais sobre todo o material apresentado em aula, de maneira visual;
· boa postura do aluno, evitando-se os maneirismos comumente exibidos pelos que são cegos;
· adaptação de materiais escritos de uso comum: tamanho das letras, relevo, softwares educativos em tipo ampliado, textura modificada, etc.;
· máquina Braille, reglete, sorobã, bengala longa, livro falado, etc.;
· organização espacial para facilitar a mobilidade e evitar acidentes: colocação de extintores de incêndio em posição mais alta, pistas olfativas para orientar na localização de ambientes, espaço entre as carteiras para facilitar o deslocamento, corrimão nas escadas, etc.;
· material didático e de avaliação em tipo ampliado para os alunos com baixa visão e em Braille e relevo para os cegos;
· braille para alunos e professores videntes que desejarem conhecer o referido sistema;
· materiais de ensino-aprendizagem de uso comum: pranchas ou presilhas para não deslizar o papel, lupas, computador com sintetizador de vozes e periféricos adaptados, etc.;
· recursos ópticos;
· apoio físico, verbal e instrucional para viabilizar a orientação e mobilidade, visando à locomoção independente do aluno.

PSICOLOGIA DO DESENVOLVIMENTO V

O PSICÓLOGO E AS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA VISUAL
Maria Lucia Toledo Moraes Amiralian


Segundo a autora, a especificidade do psicólogo é a compreensão do mundo psíquico e a aplicação de procedimentos que venham a ajudar o ser humano em seu processo de desenvolvimento e adaptação às situações de vida, nos diferentes momentos de sua existência, em qualquer que seja o seu campo de atuação: clínico, escolar ou social.
Porém, na prática há uma dicotomia entre essas áreas, principalmente no que se refere à educação e à saúde, favorecendo a falta de integração entre os profissionais desses dois campos.
Isso se torna mais evidente com a Educação Especial que, por ficar no limiar entre a educação e a saúde, atualmente, encontra-se marginalizada.
Apresenta a posição dos profissionais adeptos da full inclusion que criticam o atendimento por professores especializados na comunidade escolar para os alunos cegos ou com baixa visão, por considerar uma atividade segregadora e, ao mesmo tempo, afirma que quando se trata da “reabilitação” dessas pessoas, as atividades são feitas no intuito de uma transformação das mesmas, com vistas a torná-las o mais possível semelhantes aos que enxergam.
Um outro aspecto destacado no texto é a pouca familiaridade do “jovem psicólogo” com as pessoas com deficiência visual, ou seja, eles recebem algumas informações teóricas, mas falta-lhes a vivência e a oportunidade para que se inteirem um pouco mais sobre as questões relacionadas à deficiência visual ainda em seus anos de formação.

As contribuições dos psicólogos para a educação e reabilitação

A autora apresenta as diferentes atuações dos psicólogos junto às pessoas com deficiência visual, destacando os seguintes momentos:
- No que se refere às crianças:
o Intervenção precoce: importância na prevenção de possíveis falhas e perturbações que poderão ocorrer para aqueles com problemas congênitos, tanto pelas dificuldades dos pais, e fundamentalmente da mãe, em aceitar a imperfeição de seu filho e ter condições de proporcionar-lhes uma saudável relação mãe-filho;
o Na primeira infância: fundamental importância a orientação aos pais que devem ficar atentos ao desenvolvimento psicomotor, da linguagem, da organização do esquema corporal, da integração no espaço e no tempo etc;
o Na idade escolar: tanto os alunos, como os pais e os professores especializados, devem ser orientados sobre as condições que mais facilitam e propiciam suas aquisições cognitivas e interações sociais mais amplas.
- Com os jovens: observar todas as dificuldades que ocorrem nesse período, principalmente a questão da própria adolescência, a luta pela independência, a definição da identidade, etc.
- Com os adultos: refere-se ao aspecto de perda da visão motivada por acidente em que deve ser discutida uma nova identidade acrescida por questões relacionadas à realização profissional.

A autora, a partir de alguns pressupostos winnicottianos, traz como aspectos fundamentais: a concepção de um desenvolvimento sadio para o deficiente visual e que a deficiência só se constituirá como uma condição perturbadora ou um distúrbio, na interação do indivíduo com o meio ambiente.
Dessa forma, apresenta como uma das principais funções do psicólogo para a educação e reabilitação das pessoas com deficiência visual a de transmitir a importância da aceitação da deficiência, para a pessoa, para seus familiares e para o ambiente que a cerca.
Um dos exemplos para mostrar as modificações introduzidas pela ausência ou limitação visual no universo mental das pessoas é o uso e conceito de tempo e espaço. O conceito de espaço adquirido pelas pessoas cegas, por meio de experiências tácteis-cinestésicas, difere do conceito de espaço adquirido pelos videntes: ele só pode ser adquirido pela contínua experimentação do movimento pela criança, e as informações recebidas precisam ser organizadas passo a passo para a construção do todo.
Destaca qual o propósito que dirige todas as ações do psicólogo no atendimento às pessoas com deficiência visual: a incorporação de uma atitude de crença na possibilidade de uma real integração entre pessoas diferentes, transmitindo essa certeza aos outros profissionais, familiares dessas próprias pessoas e à comunidade como um todo.

Outras abordagens da autora no que se refere à inclusão social:

- Não enfocar as incapacidades causas pela limitação ou ausência da percepção visual, mas o modo próprio de ser que constitui as pessoas que possuem uma deficiência visual;
- Maneiras diferentes de pensar e ser não se constituem como erro ou fracasso, mas, pelo contrário, a constatação da diferença é freqüentemente um dado enriquecedor.

Destaca que é de fundamental importância para a eficácia do atendimento aos indivíduos com deficiência, como o psicólogo incorporou e assimilou o conceito de deficiência, qual o significado que ele, consciente e inconsciente, dá à condição de cegueira, como ele se sente diante de uma pessoa cega ou de baixa visão.

Finalizando, a autora afirma que o psicólogo pode contribuir de várias maneiras e
em várias situações, mas em todas elas transmitindo a importância da aceitação, que não se restringe à aceitação da deficiência visual como uma condição da realidade, que não se pode deixar de constatar, mas sim de uma aceitação da pessoa como ela é.

BIBLIOGRAFIA:
MASINI, Elcie F. Salzano (org.). Do sentido...pelos sentidos...para o sentido... Niterói:Intertexto. São Paulo;Vetor, 2002.